quarta-feira, 28 de maio de 2008

O brasileiro ri da própria desgraça

Dizem que uma das características que diferencia o brasileiro de outros povos é sua capacidade de cair e se levantar, e, principalmente, de rir da própria desgraça. O livro do Mouzar Benedito 1968... por aí Memórias burlescas da Ditadura (Ed. Publisher) é uma prova disso. Em 1968 ele estudava Geografia na USP e morava no Crusp, que foi invadido pela polícia, logo após a decretação do AI-5. As histórias registradas no livro - de 1964 a 1985 - são hilárias e ao mesmo tempo representam um resgate histórico feito por quem viveu aquele momento sombrio da nossa história. Ali é possível entender a sequência dos acontecimentos e o envolvimento de estudantes, trabalhadores e do povo no combate à ditadura.

Entre as histórias contadas pelo Mouzar, estão as dos livros confiscados no Crusp pelos agentes do regime militar. O primeiro lembrado é um livro de um dos estudantes de engenharia hidráulica cujo título foi considerado bastante subversivo: Bombas hidráulicas. Outro livro apreendido, foi A Capital, assim mesmo A Capital. Para os agentes, A Capital de Eça de Queiroz e O Capital de Karl Marx, davam na mesma.

Mas Mouzar não se limita ao ano de 1968. Ele passa pelo período mais crítico, pela Anistia e pela volta dos exilados, conta causos nas redações dos jornais Versus e Pasquim, e chega aos anos 1980.

Recolhi esta parte do capítulo "Versus um jornal de aventura e cultura", para mostrar como na época alguns jornalistas se dedicavam à profissão.

"Cheirinho bom
Éramos tão apaixonados pelo jornal [Versus] que queríamos vê-lo pronto logo que saía da gráfica. E isso acontecia sempre de madrugada, horário em que as máquinas ficariam ociosas e a impressão era mais barata.

Lembro-me de uma época em que o Versus era impresso na gráfica do São Paulo Shimbum, um jornal japonês com sede na Baixada do Glicério, área decadente da região central de São Paulo.

Três horas da manhã, ficávamos aquele bando de jornalistas esperando o jornal ser impresso. Na hora que entrava na gráfica, ficávamos no lugar onde ele saía, pegávamos o primeiro exemplar que saía das máquinas e o olhávamos como um filho recém-nascido, cheirávamos o jornal, nos comovíamos. Gostávamos demais do resultado do nosso trabalho."

3 comentários:

Unknown disse...

ah, que post delicioso!!
primeira parte: adoro essas histórias de ditadura. outro bom livro é o 1968 o ano que não acabou, do zuenir ventura. também traz histórias hilárias a respeito da já célebre "perspicácia" dos agentes da repressão.
coisa que gosto é escutar as músicas daquela época... como um ser humano dotado de um mínimo de cérebro deixa passar composições como cálice, vai passar, apesar de você, deus lhe pague, abacateiro e... pra não dizer que não falei das flores(?????!!!!!)? pois deixaram... graças a deus.

quanto ao trecho do livro, realmente é bom demais ver realizado um trabalho pelo qual você é apaixonado, do qual sente orgulho. eu, jornalista medíocre, sinto isso quando vejo impressa alguma matéria que amei fazer. imagine naquela situação!

belo blog, parabéns! saudações blogosféricas!

Patty Diphusa disse...

Está vendo com vc é? Já me fez ter vontade de ler o livro logo, logo.

Bjs,

Reiko Miura disse...

Meninas,

tirando minha amizade com o Mouzar, com quem ando por aí à caça de sacis, o livro vale a pena. Fico lendo no ônibus e rindo sozinha. Devem pensar que sou louca!

lorena, também adoro as músicas daquela época e, é claro, adoro o Chico, que passou por ela e continua incrível até hoje.

bjs.