De José Roberto Garcez
Mais de dez anos depois de o PT ter chegado ao poder no governo federal
eu continuo impressionado como quase todos os coleguinhas da cobertura
política da mídia comercial ainda não entendem a dinâmica interna do
partido.
É claro que, muitas vezes, alguns usam as diferenças de disputas
internas do PT com os demais partidos para estimular aparentes
contradições. Não há só ingênuos, há os que querem ser muito espertos.
Acostumados com o modo de funcionamento das outras siglas, muitos não
compreendem a profunda vida interna petista. Mesmo agora, com a
diminuição da rica diversidade que caracterizava o partido nas décadas
de 80 e 90, ainda somos muito diferentes dos demais. E os repórteres de
política não alcançam isso. Eles medem todos pela mesma régua dos
partidos tradicionais.
Este fim de semana a revista Época acaba de dar mais uma demonstração
dessa ignorância. Uma repórter fez uma extensa matéria falando do
candidato "inventado" Fernando Haddad. O fio condutor da matéria é que
Haddad não é um petista típico. Alguns dos argumentos: filosofa em
alemão, é amigo de tucanos e "tem postura crítica em relação a várias
posições abraçadas pelo PT". Seria difícil encontrar algo mais
superficial e equivocado. Em primeiro lugar, demonstra o mesmo
preconceito da época do surgimento do PT: éramos uns ignorantes de
macacão e nos escondíamos atrás das barbas fartas para não demonstrar a
incapacidade de falar português, quanto mais alemão.
Também éramos bichos do mato, pois não tínhamos capacidade de formar
amizades fora do restrito círculo das pessoas com estrelinhas no peito.
Mas esses são preconceitos comportamentais que diminuíram com nossa
proximidade - e gosto - com o poder. Mas o fato de Haddad não concordar
com todas as posições das correntes majoritárias no PT confirma a
ignorância sobre o debate interno do partido. Haddad é acusado de ter
assinado o manifesto que propunha a refundação partido em 2005 e por
outras insurgências contra a direção partidária. Tudo para comprovar a
tese de que ele não é um "petista de carteirinha". A mesma tese que foi
- e, alguns casos, ainda é - usada contra Dilma. Parece brincadeira de
criança: estimular a divisão interna para derrotar o inimigo. A matéria
diz que Haddad "não é da turma", numa tentativa ambígua de falar bem e
mal ao mesmo tempo do provável futuro prefeito de São Paulo.
Essa imprensa não consegue entender que o que resta de debate interno no
PT, com toda sua riqueza de contradições, é o que nos assegura a
capacidade militante do partido em continuar conectado com as aspirações
da maioria da população. São essas divergências que alimentam a relativa
não acomodação aos estamentos de poder e nos levam às ruas para ouvir a
indispensável vontade popular capaz de construir programas de governo
que atendem as necessidades da população e alimentam a esperança de
continuar mudando a sociedade.
Enquanto os nossos inimigos continuarem com essa visão superficial e
simplista da vida política dentro do PT nós continuaremos crescendo.
Ainda mais se incentivarmos a renovação de quadros e, logo mais, de
direção do partido para continuar nossa trajetória de apresentar à
sociedade propostas para avançar na democratização, na justiça social e
na inclusão.
José Roberto Garcez é jornalista
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