De Leonardo
Boff, no jornal Brasil de Fato em 17/09/2012
Há
um provérbio popular alemão que reza: “você bate no saco, mas
pensa no animal que carrega o saco”. Ele se aplica ao PT com
referência ao processo do “mensalão”. Você bate nos acusados,
mas tem a intenção de bater no PT. A relevância espalhafatosa que
o grosso da mídia está dando à questão mostra que o grande
interesse não se concentra na condenação dos acusados, mas através
de sua condenação, atingir de morte o PT.
De
saída quero dizer que nunca fui filiado ao PT. Interesso-me pela
causa que ele representa pois a Igreja da Libertação colaborou na
sua formulação e na sua realização nos meios populares. Reconheço
com dor que quadros importantes da direção do partido se deixaram
morder pela mosca azul do poder e cometeram irregularidades
inaceitáveis. Muitos sentimo-nos decepcionados, pois depositávamos
neles a esperança de que seria possível resistir às seduções
inerentes ao poder. Tinham a chance de mostrar um exercício ético
do poder na medida em que este poder reforçaria o poder do povo que
assim se faria participativo e democrático.
Lamentavelmente houve a
queda. Mas ela nunca é fatal. Quem cai, sempre pode se levantar. Com
a queda não caiu a causa que o PT representa: daqueles que vem da
grande tribulação histórica sempre mantidos no abandono e na
marginalidade. Por políticas sociais consistentes, milhões foram
integrados e se fizeram sujeitos ativos. Eles estão inaugurando um
novo tempo que obrigará todas as forças sociais a se reformularem
e também a mudarem seus hábitos políticos.
Por
que muitos resistem e tentam ferir letalmente o PT? Há muitas
razões. Ressalto apenas duas decisivas.
A
primeira tem a ver com uma questão de classe social. Sabidamente
temos elites econômicas e intelectuais das mais atrasadas do mundo,
como soía repetir Darcy Ribeiro. Estão mais interessadas em
defender privilégios do que garantir direitos para todos. Elas nunca
se reconciliaram com o povo. Como escreveu o historiador José
Honório Rodrigues (Conciliação e Reforma no Brasil 1965,14), elas
“negaram seus direitos, arrasaram sua vida e logo que o viram
crescer, lhe negaram, pouco a pouco, a sua aprovação, conspiraram
para colocá-lo de novo na periferia, no lugar que continuam achando
que lhe pertence”. Ora, o PT e Lula vem desta periferia.
Chegaram
democraticamente ao centro do poder. Essas elites tolerariam Lula no
Planalto, apenas como serviçal, mas jamais como presidente. Não
conseguem digerir este dado inapagável. Lula presidente representa
uma virada de magnitude histórica. Essas elites perderam. E nada
aprenderam. Seu tempo passou. Continuam conspirando, especialmente,
através de uma mídia e de seus analistas, amargurados por
sucessivas derrotas como se nota nestes dias, a propósito de uma
entrevista montada de Veja contra Lula. Estes grupos se propõem
apear o PT do poder e liquidar com seus líderes.
A
segunda razão está em seu arraigado conservadorismo. Não quererem
mudar, nem se ajustar ao novo tempo. Internalizaram a dialética do
senhor e do servo. Saudosistas, preferem se alinhar de forma agregada
e subalterna, como servos, ao senhor que hegemoniza a atual fase
planetária: os USA e seus aliados, hoje todos em crise de
degeneração. Difamaram a coragem de um presidente que mostrou a
autoestima e a autonomia do país, decisivo para o futuro ecológico
e econômico do mundo, orgulhoso de seu ensaio civilizatório
racialmente ecumênico e pacífico. Querem um Brasil menor do que
eles para continuarem a ter vantagens.
Por
fim, temos esperança. Segundo Ignace Sachs, o Brasil, na esteira das
políticas republicanas inauguradas pelo PT e que devem ser ainda
aprofundadas, pode ser a Terra da Boa Esperança, quer dizer, uma
pequena antecipação do que poderá ser a Terra revitalizada,
baixada da cruz e ressuscitada. Muitos jovens empresários, com outra
cabeça, não se deixam mais iludir pela macroeconomia neoliberal
globalizada. Procuram seguir o novo caminho aberto pelo PT e pelos
aliados de causa. Querem produzir autonomamente para o mercado
interno, abastecendo os milhões de brasileiros que buscam um consumo
necessário, suficiente e responsável e assim poderem viver um
desafogo com dignidade e decência. Essa utopia mínima é factível.
O PT se esforça por realizá-la. Essa causa não pode ser perdida em
razão da férrea resistência de opositores superados porque é
sagrada demais pelo tanto de suor e de sangue que custou.
*Leonardo
Boff é teólogo, filósofo, escritor e dr.h.causa em política pela
Universidade de Turim por solicitação de Norberto Bobbio.
Nenhum comentário:
Postar um comentário